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O agronegócio é um dos principais fatores de desenvolvimento de Chapecó e do Oeste de Santa Catarina. Mesmo diante da retração econômica do País, o setor continua sendo a alavanca de crescimento da região. Nesta entrevista, o diretor de Agronegócio da ACIC, Vincenzo Mastrogiacomo, faz uma análise da contribuição do agronegócio para a região.
Mastrogiacomo é engenheiro químico, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1970, nasceu na Itália em 4 de outubro de 1944 e naturalizou-se brasileiro em 1983. Reside em Chapecó desde 1989. É sócio da Safrio Serviços de Armazenagem Frigorificada. É casado e tem três filhas. Atuou como diretor da Sadia S/A e da Cooperativa Central Aurora Alimentos nas áreas de abate, industrialização, pesquisa e desenvolvimento de produtos e garantia da qualidade.
Em sua opinião, o agronegócio continuará sendo a base da matriz econômica de Chapecó e do grande oeste catarinense? Por quê?
Chapecó e o grande oeste representam a base econômica de Santa Catarina. Somos o grande produtor de carne de frango e suína e a grande fonte de exportação da balança comercial do Estado. Os cinco maiores produtos de exportação passam pelo agronegócio. As grandes empresas estão no oeste e são responsáveis por grande parte das receitas e empregos criados no Estado. Por isso, o agronegócio foi e ainda vai ser o grande potencial de desenvolvimento do oeste e de Santa Catarina.
Dentro do agronegócio surgirão novas áreas de inovação e expansão? Quais?
As indústrias precisam se renovar, acompanhar a evolução do mundo. As empresas estão voltadas para o mercado nacional e internacional e têm que acompanhar as normas, as leis e, para isso, precisam ter novos equipamentos e melhorar a qualidade da carne que está sendo processada. A introdução das feiras periodicamente – no nosso caso a Mercoagro, que ocorre a cada dois anos, dando sequência às feiras mundiais, como a IFFA na Alemanha – é essencial. É nas feiras que se confere todas as inovações tecnológicas que darão melhor qualidade e produtividade às empresas. O agronegócio está inserido dentro do processo de inovação e automação com o desenvolvimento, por exemplo, de novas embalagens, melhores formas de conservação e outras melhorias que proporcionam melhor qualidade de vida para os consumidores. Isso passa por mudanças como o uso de menos sal, menor quantidade de nitritos e aditivos, entre outros. As novas tecnologias acompanham todo o processo, desde a criação dos animais até o produto final. Nesse processo, Santa Catarina tem um diferencial que é ser reconhecido como Estado de excelência por não ter febre aftosa sem vacinação e livre de peste suína clássica. Por isso, ganha mercado como, recentemente, a Coreia do Sul, que reconheceu a qualidade do Estado e, em breve, importará carne suína catarinense.
Agroindústrias e produtores rurais reclamam, há décadas, das deficiências infraestruturais da região (falta de ferrovias, rodovias, armazéns, aduanas interiorizadas etc) que impactam no desempenho do setor. Como reduzir essas deficiências?
Ao mesmo tempo em que temos um enorme potencial econômico, que é o agronegócio, temos pontos negativos, como na infraestrutura, principalmente rodoviária. Possuímos caminhões da melhor qualidade do mundo, porém as nossas estradas fazem com que o desempenho não seja o mesmo que em outros países. Devido à precariedade das rodovias, os caminhões consomem mais combustível e mais peças, por exemplo, o que aumenta os custos e diminui a competitividade. Precisamos trazer insumos de fora, como papel, condimentos, aditivos, milho, farelo de soja e as estradas estão cada vez piores. Uma alternativa seria as ferrovias, tanto a norte-sul, que contribuiria para o transporte de milho e farelo de soja, quanto a implantação da ferrovia do frango, para o escoamento da produção até os portos do Estado. O problema das ferrovias é que o governo não tem verbas para a construção. Então, temos que aguardar a iniciativa privada ou público-privada ou ainda esperar as condições políticas e econômicas se alinharem para buscar a viabilização de recursos para essas obras.
O presidente da Fiesc defende que o oeste pague tributos menores para compensar essa falta de infraestrutura. O que o senhor acha dessa tese?
Pagamos nossos impostos e não temos o devido retorno. Penso que as federações de Santa Catarina, tanto a Facisc como a Fiesc, têm que se juntar para reivindicar melhorias para as empresas e indústrias. Ninguém está negando pagar impostos, apenas queremos um retorno justo. Sou favorável ao pagamento de menores tributos, pois, dessa forma, poderíamos aplicar em melhorias na infraestrutura. Mas essa é uma tese que precisa de muita política e gestão competente para poder andar.
Podemos dizer que a crônica escassez de milho aliada a essas deficiências logísticas constituem os dois grandes problemas da agroindústria catarinense?
Temos uma grande produção de milho no Brasil e, normalmente, não é toda consumida. Sempre sobre uma quantidade que se chama estoque regulador. Quando inicia a entressafra, o estoque regulador entra no mercado e abastece as agroindústrias e produtores. Porém, no fim de 2015 aconteceu um fato novo: a exportação de milho. O estoque regulador foi direcionado para exportação, resultando falta do grão no mercado interno. O preço subiu em quase 70%, chegando a R$ 60 a saca. Aliado a isso, houve alguns problemas na safra e as indústrias se viram obrigadas a buscar em outras fontes. O Brasil exportou quase 23 milhões de toneladas. Exportar é bom, mas exporta-se só o excedente. O País produz cerca de 50 milhões de toneladas de milho, consumimos uns 40 milhões de toneladas, então sempre sobra um estoque regulador. Por isso, deveria haver um controle mais efetivo entre produção, consumo e exportação.
Ainda existe espaço para crescimento das cadeias produtivas industriais da avicultura e da suinocultura ou já chegamos ao limite?
Acredito que ainda podemos crescer, mas com muito cuidado, em função da falta de infraestrutura, além de problemas ambientais, como seca, e problemas de energia elétrica, que também comprometem nossa região. Temos usinas, mas não temos subestações para distribuir a energia. Porém, acredito que as empresas que estão aqui instaladas têm condições de aumentar os seus parques, principalmente no que se refere à qualidade, produzindo com mais valor agregado.
E no caso das cadeias de grãos (milho, soja, feijão) e de leite? Chegamos ao limite da fronteira agrícola?
Santa Catarina produz em torno de 3 milhões de toneladas de milho ao ano. Um estudo da Secretaria de Agricultura e Pesca mostra que temos terra para produzir 5 milhões de toneladas. Isso nos beneficiaria enormemente, mas o agricultor produz o que está com melhor preço, ora milho, ora soja ou feijão. O potencial leiteiro também tem condições de crescer. Agora houve escassez porque o inverno está rigoroso e o milho está com preço elevado, mas a região ainda é altamente produtora. Quanto ao milho, há um novo programa da Secretaria de Agricultura e Pesca, por meio do qual o Governo do Estado fornece um subsídio para o produtor como forma de incentivar a produção.
Qual é o papel da Mercoagro no estímulo ao desenvolvimento econômico do grande oeste catarinense?
Chapecó é o berço das indústrias da carne, o que trouxe desenvolvimento para toda a região. A Mercoagro foi criada em 1994, sendo que em 1996 ocorreu a primeira edição do evento. O objetivo era justamente fomentar o desenvolvimento por meio de novas tecnologias. A primeira edição da feira abrangeu 300 frigoríficos num raio de 100 quilômetros de Chapecó. A feira veio para trazer os fornecedores de equipamentos, embalagens, aditivos, condimentos e fez com que as empresas se voltassem para Chapecó. Com o tempo não foi mais preciso importar equipamentos, pois surgiram empresas no Brasil. Se olharmos Chapecó há 20, 30 anos, não tinha nenhuma empresa metalomecânica. Atualmente temos muitas que produzem máquinas para montar um frigorifico inteiro, tanto de aves como de suínos. A Mercoagro trouxe tecnologias e formação de mão de obra qualificada, por meio da promoção de seminários em parceria com escolas técnicas e universidades. Nesses 22 anos de realização do evento, a contribuição foi enorme e continua sendo. Neste ano, com a retomada da feira pela ACIC, ela volta aos critérios iniciais, ou seja, trazer desenvolvimento, inovação, tecnologia para Chapecó e região.
Como poderia ser otimizado o relacionamento entre as agroindústrias e as universidades em favor das pesquisas nas áreas bromatológicas?
Esse é um campo que precisaria crescer. Acredito que a indústria precisa se aproximar mais da universidade, que possui laboratórios técnicos e professores capacitados para desenvolver novas tecnologias. As empresas acabam buscando isso fora e pagam mais, sendo que poderíamos desenvolver boa parte delas utilizando a estrutura educacional local. Por meio da ACIC e das federações industriais e comerciais do Estado podemos cada vez mais entrosar escolas técnicas e universidades com as empresas. Ao mesmo tempo em que as empresas têm que ir buscar, as instituições de ensino também precisam sair de dentro de suas quatro paredes e oferecer seu potencial de pesquisa técnica e acadêmica. A Mercoagro contribui nesse processo. Teremos, durante a feira, diversos seminários e palestras para criar essa interface e estreitar esse relacionamento entre instituições de ensino e indústrias.